Textos e reflexões de Rodrigo Meireles

26.12.10

A rede social

É bem verdade que o homem é um ser social, dado que não pode sobreviver sem uma relação com algo ou alguém para além de si. Há mesmo quem diga que o homem está diretamente implicado com o mundo no qual vive, com suas nuances e peculiaridades; e há ainda quem afirme que o homem vive em meio ao social e cria laços significativos para a sua existência. No entanto, este mesmo homem, dos tempos modernos ao tempo de hoje, tem atravessado grandes mudanças e vivido alguns fenômenos típicos deste período histórico que parecem contradizer (ou paradoxalmente reforçar) a dimensão social de sua existência. Fenômenos como o individualismo e o niilismo são marcas do homem contemporâneo, como já previa Nietzsche nos anos 1800 e como já havia notado Heidegger em meados dos século passado.

O filme dirigido por David Fincher, "A Rede Social", confirma essa caraterização. Curiosamente um filme que narra a aventura de um nerd cuja principal forma de existência é o computador e que cria uma rede social virtual. A "rede social" que ele cria conecta milhões de pessoas de todo o mundo facilitando a troca de informações, mensagens e até de arquivos, a depender dos aplicativos utilizados. O filme "A Rede Social" não é só a história de criação de um site de sucesso, pois retrata a geração dos jovens de hoje, cada vez mais ávidos por informação e cada vez mais ágeis na obtenção de tal informação.

Sem uma análise mais criteriosa, é fácil perceber que estamos sempre mais conectados, todavia, sempre mais presos e dependentes ao computador, que virou amigo de confiança. A rede social de um suposto mundo virtual ganha força com a troca de informações do mundo real, o que me faz afirmar que mesmo o virtual é real. No entanto, o que está em jogo aqui é a dependência que as ferramentas tecnológicas podem exercer sobre a pessoa, uma vez que criam uma nova forma de intermediário na relação interpessoal. A pessoa tende a depender de algum instrumento para estabelecer ou mesmo fortalecer suas relações, pois ela mesma não é capaz de encarar o mundo e o outro de forma direta como forma de se proteger.

Com as diversas redes sociais espalhadas na internet, é possível perceber que se por um lado elas são bastante úteis para aproximar as pessoas, por outro podem ser prejudiciais quando criam dependência ou quando em nada contribuem para o florescimento das relações pessoais no dia-a-dia de cada usuário. Se há quem se conecte para dizer o que está fazendo ou sentindo para as suas centenas de "amigos", há quem se conecte porque não há amigos de fato e o computador é um intermediário na sua relação com mundo. Em suma, mesmo com a expansão das redes sociais na rede mundial de computadores, não há nada que se compare com os contatos pessoais. Facebook, Orkut, MySpace, dentre outras redes, precisam ser espaços bem utilizados, de modo a complementar ou enriquecer o universo pessoal de quem as utiliza. Do contrário, será somente mais uma evidência do crescente (e paradoxal) isolamento do homem de hoje.

Para finalizar, faço o convite para assistir ao filme citado e tirar as próprias conclusões! São muitas as questões que podem ser levantadas sobre este argumento e certamente poderei retomá-las em outras oportunidades. Enquanto isso, você também pode manifestar as suas reflexões clicando no link logo abaixo do trailer.






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13.12.10

Adagio



O branco no preto

................da vida que dança

............................nas folhas que flutuam

.............................................no vento que empurra

............................................................os pássaros no tempo

.............................................................................................no tempo

................................................................................................................tempo

......................................................................................................................................

É hora de viajar e transpirar poesia ouvindo a suave interpretação de Prelude in B Minor de Serge Rachmaninov (Op. 32, nr. 10), executada pelo pianista italiano Alessio Nanni. Sugiro que se assista em tela cheia (fullscreen).


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11.12.10

Em busca de um sentido para a vida

Compartilho um interessante flash mob realizado em uma estação ferroviária na Bélgica que nos mostra, para além da beleza do evento, a necessidade de algo que movimente as pessoas, sobretudo em um mundo onde prevalece a noite cultural e no qual a escuridão dificulta a visão das coisas e do seu verdadeiro ser.

Percebo neste exemplo que o homem é capaz de fazer qualquer coisa para alcançar a alegria de viver, mesmo em um evento tão fugaz e aparentemente insignificante. Todavia, ainda está paralisado na sua falta de sentido, daí porque facilmente se encanta com a originalidade aparente da loucura. Atrevo a dizer que o homem de hoje ainda não foi capaz de compreender que a pior loucura é o vazio de sentido, e se admira com a aparente loucura dos que ousam fazer atos e gestos diferentes do que regem a norma social. Como podemos no vídeo abaixo, ao som de "Do-Re-Mi", do clássico do cinema "A Noviça Rebelde" (1965), vários dançarinos chamaram a atenção dos passantes de uma estação belga com seus passos coordenados, causando uma grande admiração.

Não surpreende o encanto que podemos colher nos olhares admirados das pessoas que observam ao redor. Todavia, para além do aspecto surpreendente do evento, que chama a atenção pelo inesperado, é possível enxergar na admiração de cada espectador a constatação de que também ele é capaz de fazer algo de diferente, mudando a sua rotina tantas vezes marcada por movimentos repetitivos que nem ele mesmo consegue explicar. Felizmente, embora o passo a ser dado em seguida seja mais difícil do que a constatação das próprias capacidades, é essa constatação que me faz entrever que o homem de hoje pode sair do niilismo que o marca e dar passos corajosos rumo a um sentido para a própria existência.






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4.12.10

NÃO ao PL do Ato Médico

Reproduzo abaixo um manifesto divulgado pelo Conselho Federal de Psicologia contra o Projeto de Lei do Senado 268/2002 (e o PLC 7.703/2006), que visa a regulamentar a profissão de médico no Brasil, mas que há anos vem gerando controvérsias entre os profissionais da saúde. O mesmo PL já sofreu várias modificações ao longo dos anos, mas continua a restringir a atuação dos demais profissionais de saúde, além de colocar em cheque os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) no que tange o acesso livre do cidadão aos serviços de saúde.

Nós, profissionais da saúde, convidamos toda a classe médica para um debate democrático que vise a regulamentação da profissão médica sem, com isso, cair num corporativismo capaz de minar o conhecimento e a prática dos demais profissionais. Todas as profissões de saúde têm de estar a serviço da vida e do cidadão e a regulamentação de cada profissão não pode estar acima disso.

Para conhecer os vários Projetos de Lei que tramitaram entre os parlamentares ao longo dos anos, clique aqui.

Manifesto do CFP (03/12/2010)

Ato Médico: PL não é consenso entre as profissões da saúde

Uma tentativa de colocar o Projeto de Lei nº 268/2002, conhecido como Ato Médico, na pauta do plenário do Senado Federal em regime de urgência, sem que tenha havido consenso entre os diversos setores da área da saúde, foi realizada na tarde de quarta-feira, 1 de dezembro de 2010, quando representantes da classe médica foram ao gabinete do senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado, fazer a solicitação. Não há um texto de consenso para o PL, ao contrário do que vem sendo anunciado por setores da medicina.

A possibilidade de votação do PL a toque de caixa, no final da legislatura, preocupa as profissões da saúde, pois não foi realizada uma discussão mais ampla no Congresso e o debate, definitivamente, não foi amadurecido na sociedade brasileira, que é a maior prejudicada pelas mudanças. O PL do Ato Médico, tal como está, interfere diretamente no funcionamento do Sistema Único de Saúde. Se aprovado, o PL afetará a todos os usuários do SUS. Ademais, o projeto ainda não passou por todas as comissões que deve passar no Senado.

Em reunião com o presidente do Senado Federal, José Sarney, na terça-feira, 23 de novembro, representantes de conselhos profissionais, fóruns e associações de profissionais e usuários da saúde expuseram suas preocupações em relação ao PL. Na ocasião, Sarney assegurou que o projeto não entraria na pauta em regime de urgência e reconheceu que o assunto é controverso. “Não vamos colocar em urgência, estou vendo que é um assunto controvertido”, afirmou o presidente do Senado.

Estiveram na reunião conselheiros do Conselho Nacional de Saúde (CNS), representantes do Fórum das Entidades Nacionais dos Trabalhadores da área da Saúde (Fentas), da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), dos Conselhos Federais de Psicologia (CFP), de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Cofito), de Fonoaudiologia e de Enfermagem. O movimento contra o PL do Ato Médico reúne entidades e associações de diversas profissões da saúde.

O chamado Ato Médico interfere na autonomia do trabalho das profissões da saúde e causa danos ao SUS ao prejudicar o atendimento integral à saúde da população. O debate é essencial para que seja garantida à sociedade o direito do atendimento multiprofissional.

Clique aqui para aderir à campanha virtual e enviar manifesto aos senadores.

Conselho Federal de Psicologia



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30.11.10

A fonte das prospecções

Era uma família como todas as outras, o pai e a mãe trabalhavam e os dois meninos estudavam regularmente. Saíam de casa com certa freqüência e tinham muitos amigos, que os faziam ter sempre muitas opções extras de lazer, além da corriqueira rotina.

Mas um desses meninos queria muito mais. Não bastava a sua vida comum de um menino comum no alto dos seus normais e comuns oito anos. Não servia muito saber que na sua idade a brincadeira ainda estava em voga e a ele não interessava nem mesmo saber a que nível se encontrava em meio aos seus estudos. O menino queria ser grande e procurava se encontrar sempre mais longe do que a sua imaginação permitia.

Um certo dia, estava ele defronte a uma fonte que jorrava sem parar fortes jatos d’água em três direções. Olhou para essa fonte e compenetrou-se nela; olhou-a não como um simples turista olharia, mas via cada gota de cada jato, e, na transparência dessas gotas, aquele olhar ia mais além. Via o futuro e viajava em seus sonhos que voavam naquelas gotas.

Um brilho exuberante parecia nascer daquela fonte à medida que o menino aprofundava o seu olhar. Inúmeras gotas, inúmeras idéias, inúmeras tarefas, inúmeras pessoas, inúmeros projetos. Imagens que viajavam na sua mente infantil na velocidade de cada gota que via passar. Ele estava longe, absorto nos seus pensamentos. A sua vida de menino não era o bastante para o que havia em mente. Nada mais importava senão o querer adaptar-se imediatamente a uma situação que estava além do que ele poderia realmente ser. O seu mundo estava formado e desde então idealizado em forma de gotas viajantes.

Após alguns minutos, os jatos foram aos poucos se enfraquecendo e as gotas paravam de jorrar na mesma intensidade. Também aos poucos o menino perdia forças e a energia que parecia emanar do vislumbre das gotas da fonte sumia conforme a mesma era desligada. Logo ele definhou e se foi, perdendo seus sonhos em gotas e atirando-se no martírio dos próprios desejos.


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29.11.10

Due anni all'Accademia della Sapienza!

Nel 6 ottobre 2010, poco meno di due mesi fa, ho compiuto due anni di impegno, vita e studio presso l'Istituto Universitario Sophia, localizzato nel piccolo paesino di Incisa in Val d'Arno (Loppiano), vicina a Firenza, in Italia.

Come ho potuto constatare, questi due anni hanno significato un tuffo nella Sapienza, con esperienze di dialogo intense, realizzate in momenti di studio, lezioni, eventi e pure di svago. Dopo la conclusione degli studi relativi ai vari corsi seguiti, ora mi dedico all'ellaborazione della tesi di laurea visando la presentazione della discussione per ottenere il titulo del Master all'inizio di febbraio prossimo. Sono certo che ritornerò in Brasile molto diverso di prima e che porterò alla mia amata terra un baggaglio culturale cui ricchezza non mi permette una descrizione completa.

Come forma di festeggiare questo mio periodo qui, mi piacerebbe condividere alcuni punti rilevanti di quest'esperienza. È impossibile non mettere in evidenza, ad esempio, la diversità culturale presente tra gli studenti, i docenti e gli altri lavoratori. Persone molto diverse che esperimentano tra di loro dei rapporti bellissimi ed intensi. Siamo un piccolo gruppo di studenti provenienti da più di 25 nazioni e con più di 20 formazioni accademiche diverse, caratteristica che fa di questo posto uno spazio multiculturale che costantemente ci invita al dialogo. È in questo ambiente che ho trovato persone disposte ad imparare sempre di più ed a pensare nuove prospettive per la politica, l'economia, la filosofia, la teologia e le scienze, sempre con uno sguardo transdisciplinare.

Alleando la serietà dello studio e della ricerca con le attività quotidiane, è facile percepire che l'esperienza vissuta qui presuppone un'apertura non solo per comprendere ciò che ci viene insegnato come anche per accogliere l'altro, che molte volte ha delle abitudini e pensieri ben diversi del mio. È così che l'esperienza universitaria diventa anche un'esperienza di vita. Ci si impara nell'aula, ma anche nella cucina dell'appartamento, nelle feste, nelle gite e nei momenti di sport e svago.

Un'altra esperienza assai significativa che sto vivendo in questi ultimi mesi è l'ellaborazione della tesi di laurea. Insieme al mio relatore, sto sviluppando le mie letture nel campo della Filosofia della Mente e della Psicologia Umanista-Fenomenologica, in modo a realizzare una lettura transdisciplinare per descrivere il rapporto mente-corpo circoscritto in questa recente teoria psicologica. Ogni settimana ci troviamo e cerchiamo di comprendere cosa ci dicono gli autori trovati, nell'esercizio di cogliere l'essenziale per rispondere alle domande della nostra riflessione. Tuttavia, quel che mi affascina di più, oltre il contenuto, è l'apertura esistente tra di noi. Questo è un lavoro che si vive insieme. Molto lontano della posizione di autorità, ancora presente nella maggior parte delle università europee, il rapporto professore/studente si rivela nello scambio di saperi attraverso il dialogo, dove uno arricchisce l'altro con la sua esperienza e conoscenza.

Ecco perché sento che lungo questi due anni ho potuto tuffarmi nella Sapienza. Qui, ho potuto imparare e crescere senza sfuggire la realtà, certo che Qualcuno mi accompagnava in quest'avventura. Pure con le difficoltà che ogni tanto vengono fuori, so che è possibile andare sempre avanti e che non ho bisogno di desistere dei miei sogni, né calpestarli in nome dell'immediatismo contemporaneo. È credendo in quest'esperienza che seguirò il mio cammino con più sicurezza, anche se esso possa sembrare incerto ed assai aperto. Continuerò ad aprire la strada del futuro con la speranza di trovare un mondo sempre migliore.

Finalmente, in questo momento in cui ricordo queste esperienze, vorrei anche registrare il mio sincero ringraziamento ad ogni persona che ha attraversato questo mio cammino lungo questi anni, poiché senza di esse quest'esperienza non sarebbe la stessa e non avrebbe il suo valore.

Per chi desidera sapere più informazioni circa quest'esperienza innovattiva, invito ad una visito al sito web dello IUS  e ad un'occhiata nei video del canale YouTube (vídeo in italiano e inglese).



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25.11.10

O amor explicitado em "Hable con Ella"

Ao assistir Hable con Ella, de Pedro Almodóvar, ocorre-me uma visão metafórica sobre o Amor incondicional. Um Amor que vai além de conceitos hoje tão banais. No filme, é por causa do amor que sentem por suas mulheres que dois homens se encontram no hospital e ali constróem uma amizade verdadeira capaz de suportar até os limites da dor causada pela solidão e mesmo pelo sentimento de perda. Que Amor tão banal seria esse que rejeitaria uma situação menos constrangedora, abandonando assim dois "corpos que falam”?

Almodóvar traz à tona nesse filme um conceito de Amor mais global e humano, em que a palavra também pode ser uma ferramenta de integração e aproximação. Não posso expressar-me sem sentir o meu corpo que expressa, do mesmo modo que, se a pessoa é um ser-em-relação e não existe expressão sem sentimento de corpo, o meu relacionar-se a um outro passa também por um sentir aquele outro em meu corpo. Essas expressões corporais estão muito bem relacionadas no filme com o cinema mudo, em cujas cenas mostradas se faz uma analogia com a importância do expressar do corpo. Em suma, o corpo sente, seja eu mesmo inserido nesse corpo, seja o outro com o qual me relaciono.

Numa clínica em que Benigno (Javier Cámara) trabalha e acompanha pacientes em coma, se percebe uma relação nascente de uma grande amizade entre ele e Marco (Mario Grandinetti), que em seus momentos assistiam o coma das mulheres que amavam, Alicia (Leonor Watling) e a ex-toureira Lydia (Rosario Flores), respectivamente.

Em meio à trama de um encontro e um reencontro entre os personagens, existe uma outra metáfora que pode ser contemplada: o Amor como um anseio de completude individual. Refiro-me, com isso, a um Amor que realiza, que completa, pois essa interação do corpo-expressão-do-ser deverá existir sempre, dado que não existe com o que não interagir. Desde que um corpo é fecundado, esse corpo não está alheio ao que acontece ao seu redor. Ao contrário, realiza-se no seu contínuo relacionar-se. Isso ocorre porque o corpo não é um limite ao outro, apenas é um intervalo que me permite aproximar-me desse outro.

Nesse ínterim, é impossível não perceber que a morte de Benigno não é propriamente uma morte, dado que há um completar-se com a concepção da mulher amada, outrora em coma. Essa metáfora se percebe devido ao paradoxo que existe em relação ao outro personagem que assiste passivamente a morte lenta e gradual da ex-toureira, que também se encontrava em coma. A compreensão do corpo como lugar das expressões do Ser é evidenciada justamente quando o ciclo se completa com a “pseudo-morte” de Benigno. Daí porque pensar na metáfora do Amor quando se admira este esplêndido filme de Almodóvar. Hable con Ella é um filme como poucos conseguem ser.





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22.11.10

Entre mares

O sorriso da companhia
o caloroso beijo de com-quem-saía
e o mar, do além, o mar... Oh mar!
Abraçar será
fazer-te chorar
e querer-te amar
na alegria de ser
no mar do amor
e será...

...será poesia
dizer que não podia
entregar-se no sonho que via?
E o meu, ali, o meu...
mar que é teu
marca teu
nome no meu
e serás!
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21.11.10

Como aprendi a voar

No dia que a conheci, estava eu em um enorme jardim repleto das mais variadas flores. Ao meu redor, um sem-fim de girassóis, tulipas, gérberas, rosas, jasmins e várias outras cujos nomes não conhecia. Fazia sol em um dia de céu claro e aberto e eu seguia a minha rotina de contemplador, a cada dia descobrindo uma nova flor.

No doce balançar do vento, as flores sorriam a cada movimento e, alcançando a sua beleza originária, conversavam entre si a poesia eterna. Cada uma, ao seu modo, revelava-se no seu florescer, abrindo-se para o mundo e descobrindo-se flor. Em meio a este concerto de vozes e cantos, eu me encontrava envolto numa atmosfera poética que me conduzia a uma sutil sensação de levitação. Eu queria voar e atingir o alto deixando-me levar pela poesia do lugar.

Foi assim que a conheci: ela, que já voava, deixava um colorido rastro por onde passava e se guiava de flor em flor em rápidos e ágeis movimentos. Era difícil acompanhá-la, pois parecia querer estar em todos os lugares e, em alguns momentos, a perdia de vista. Era encantadora e o meu desejo de voar pouco a pouco se projetava naquele vôo magistral que eu então acompanhava.

Em cada vôo, um desenho no ar, que destacavam os dons daquela que me roubava o olhar. Esplêndida conjunção de cores! Magnífica simetria! Aquele jardim já não era o bastante para um coração pulsante e desejoso de um sublime amor. Assim, com a força do vento e o dinamismo daquela singela borboleta, voei...


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10.11.10

O sucesso de "O Fantasma da Ópera"

Se tem uma herança que herdei de meu pai que não posso me esquecer e que admiro muito, esta herança é o gosto pelo musical "O Fantasma da Ópera", adaptação de sucesso do romance de Gaston Leroux. O cinema já conheceu algumas adaptações, mas aquela de maior sucesso é sem dúvida a obra-prima de Andrew Lloyd Weber, Charles Hart e Richard Stilgoe para a Broadway. O musical continua em apresentação quase diária desde 1986 com mais de 100 milhões de expectadores de todo o mundo e narra o drama amoroso de Christine Daaé, soprano que passa a fazer sucesso com sua bela voz e que se torna alvo da ciumenta paixão do fantasma, que se esconde nas galerias do Ópera de Paris, por Raoul, amor de infância de Christine que patrocina a prestigiosa casa de artes.

Hoje, o musical tem apresentações constantes em cinco cidades no mundo, segundo o site oficial, e em outubro deste ano alcançou a histórica de marca de 10.000 apresentações só em Londres, no Her Majesty's Theatre.

Mas, afinal, o que explica o enorme sucesso desta obra?

Não encontrei muitas referências para me auxiliar na resposta a esta pergunta, mas é impossível não destacar a força simbólica desta obra, com uma forte presença de figuras e arquétipos que dominam os personagens principais. Sem aprofundar-me na questão, destaco dois elementos importantes: o "anjo da música", que para Christine é a voz que a educa e a prepara para a sua exposição no mundo, e a figura de Raoul, que desequilibra a relação entre a soprano e o fantasma. É notória a luta de Christine entre o real e o imaginário, luta esta que atravessa a vida de todos nós.

Dito isto, convido você a compartilhar o teu ponto de vista sobre o sucesso desta obra e a saborear um pouco deste sucesso com o vídeo abaixo, onde estrelam Sarah Brightman e Steve Harley, dois dos primeiros atores do musical londrino.






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8.11.10

A coisa da coisa

Não é coisa alguma
que pode fazer a coisa coisar
Pode a coisa coisar como quiser
no tempo que lhe convier
Coisar sem rebeldias
e sem intimidações alheias

Mesmo se a coisa
não coisa por ela mesma
a coisa coisa o que foi coisado
coisando
o que parecia não querer
ou poder coisar

Até que
por uma coisa que viu
finalmente
a coisa coisa por querer
e descobre-se como coisa
enquanto coisa

Assim sendo
sem pressa
nem pressões
a coisa desvenda
a coisa da coisa
e coisa feliz
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7.11.10

Non ci sono spine senza rose

A febbraio 2010, è stata pubblicata sulla rivista Cidade Nova, in Brasile, una materia sulla mia esperienza di vita, in cui vengono messi in rilievo fatti significativi. Il giornalista Daniel Fassa, a partire da interviste realizzate a me ed a mia mamma, è riuscito a descrivere bene alcuni dei momenti più importanti in un testo al tempo stesso semplice e brillante. Ora, con gioia, condivido quest'esperienza anche in italiano.

Non ci sono spine senza rose

Il significato del dolore nella vita di un bambino che supera ogni fase fino a diventare un giovane felice ed intraprendente. La traversia di Rodrigo Fernandes Meireles ci va vedere i frutti del dolore abbracciato, accettato e trasformato.

Daniel Fassa
Traduzione: Rodrigo F. Meireles e Tommaso Bertolasi

“Fino lì, molto camminai. Mi avventurai camminando in quella strada piena di curve e di misteri. Cercai di svelare ogni immagine che appariva, ogni suono che udivo, ogni sensazione. Sempre proseguii avanti, non avevo ragione per fermarmi. Sentii che niente poteva trattenermi. E così sfidavo i sentieri che trovavo. Può sembrare che stessi camminando da solo, ma non mi sentivo così solo, anche quando nascevano dubbi circa tale compagnia. Qualcuno camminava con me e sentivo ciò nelle profondità del mio io”. 

Dietro queste parole del racconto “La Rosa”, di Rodrigo Fernandes Meireles, si nasconde tutta una vita: sfide, superamenti, gioie e grandi scoperte. Una vita di incontro con una rosa.

Rodrigo nasce il 30 novembre 1982, a Fortaleza (CE) Brasile, in una famiglia cattolica. Nelle parole della mamma, “era un bambino felice, sempre allegro e sorridente, sempre sereno. Gli piaceva giocare con i mattoncini di legno, con Playmobil, e passava ore concentrato in qualche giocatolo, il più delle volte, chiacchierando con degli amici immaginari. Era un bambino precoce, che imparava velocemente e presto andò in scuola. Gli piaceva molto cantare e sapeva a memoria tutte le canzoni infantili che gli insegnavamo. Non era mai di mal-umore e la sua gioia e vivacità ci contagiavano, ci disarmavano quando qualcosa ci lasciava tristi. A scuola, si trovò bene con gli altri bambini e anche lì era un bambino allegro: la sua gioia accattivava a tutti”.

Allegria e gioia sempre furono i segni distintivi di Rodrigo, dall'infanza alla gioventù, in tal modo che non sempre era facile immaginare la misura delle sfide che affrontava ogni giorno. Rodrigo nasce con la Sindrome di Crouzon, una malattia genetica che impedisce la crescita del cranio e, conseguentemente, di uno sviluppo normale del cervello, e che può generare problemi neurologici, perdita di tutte le funzioni motorie, ritardo mentale e perfino la morte. Perciò, fino ai 23 anni, si sottomise a sette interventi chirurgici.

“Quando seppi che Rodrigo aveva la Sindrome di Crouzon pensai al suo futuro: come sarebbe difficile la sua vita, in una società edonista, che valorizza la bellezza, l'estetica; quante difficoltà sarebbero venute fuori per la sua vita sociale, per quanti rifiuti sarebbe dovuto passare; e poi, quanta sofferenza fisica avrebbe dovuto superare con ogni intervento chirurgico necessario e quante conseguenze sarebbero potute sorgere in virtù di quella male formazione” - ricorda Tereza, sua mamma. “Avrebbe avuto uno sviluppo psicomotorio normale, cognitivo o avrebbe presentato qualche ritardo in futuro? Dinnanzi a questo quadro poco favorevole, capii che Rodrigo aveva bisogno più che mai di essere amato e protetto. Allora, decisi nel mio intimo di essere lo scudo di mio figlio, di dare la vita per lui, di lottare per lui, di proteggerlo in tutte le maniere possibili, per assicurargli un tratamento adeguato, che favorisse il suo sviluppo ed anche la sua socializzazione”, continua lei.

I genitori presero la responsabilità di affrontare con il bambino le difficoltà ed aiutarlo in tutto. La sofferenza e le preoccupazioni di loro erano immense, ma cercavano di non dimostrarle per trasmettere a Rodrigo soltanto la sicurezza e l'orgoglio che avevano di lui.

Il primo intervento chirurgico fu fatto a Fortaleza, ai soli due mesi di vita, con esito positivo. Dopo di essa, il tratamento venne portato avanti da un'equipe di medici di São Paulo, generando molti e lunghi viaggi. Il secondo intervento, inizialmente previsto dopo 5 anni, avvenne d´urgenza, quando Rodrigo aveva ancora tre anni, a causa di un'inaspettata ipertensione intracraniana che si manifestò con delle convulsioni. Quella volta, un'infezione ospedaliera protrasse il ricovero per un mese.

Il quadro clinico solo peggiorò, l'infezione era ormai generalizzata e neppure i migliori medici riuscivano a recuperare la salute di Rodrigo. Fu un'esperienza molto intensa, come racconta Tereza: “Capii che non siamo veramente niente e dinnanzi a quella situazione decisi di donarmi totalmente a Dio. Fu proprio lì, in quel dolore immenso, che Dio mi si rivelò ed io risolsi di seguirLo. Poco dopo, Rodrigo ricevette la visita di un sacerdote, che li applicò l'unzione degli infermi. Con nostra sorpresa, qualche giorno dopo, si risollevò, senza febbre e senza qualsiasi segno di infezione”.

Infatti, qualche anno dopo, Tereza abbracciò una consacrazione speciale nell'ambito del Movimento dei Focolari, che aveva conosciuto dai genitori e, sopratutto, dagli inumerevoli membri che si fecero presenti nella vita della sua famiglia durante il tratamento di Rodrigo.

Dopo la lunga fase di crescita, arrivò il momento di un terzo intervento chirurgico. A 12 anni, Rodrigo potè fare un passo importante: “Mia mamma mi disse: 'fin qui t'ho seguito, abbiamo viaggiato insieme a São Paulo e sono stata sempre accanto a te. Ora puoi già decidere cosa vuoi fare e come vuoi fare'. Fu la prima grande scelta cosciente che feci, il primo grande passo in cui ebbi potuto dare, personalmente, il mio sì”. Rodrigo aveva ragione. Quel “sì” personale del 1995 era il primo di molti che disse da lì in poi; principalmente, nei momenti di grandi dolori.

Nel 2000, a 17 anni, visse l'intervento chirurgico più difficile e doveva rimanere a São Paulo per un mese. Tutta la famiglia era insieme per quell'intervento. Rodrigo ricorda anche dell'atmosfera tranquilla che anticipò quell'occasione: “Le infermiere ci guardavano chiacchierare, seduti sui letti e sui divani dell'apartamento dell'ospedale. Non sembrava che qualcuno stesse soffrendo. Il clima tra noi era molto positivo, era un'atmosfera che mi faceva respirare quella scoperta dell'Amore di Dio”.

Nel periodo post-operatorio, in un giorno di intensi dolori, Rodrigo gridò, assorto in una forte sofferenza. C'era soltanto sua mamma nella camera, che lo prese per mano e disse col suo immenso amore di mamma: “ora siamo su un ponte. Che possiamo fare? Attraversiamo il fiume o restiamo qui?” Rodrigo aveva bisogno di continuare a fare i suoi passi, il suo “sì”. Non poteva fermarsi lì. E non si fermò, come narra nel suo racconto “La Rosa”:

“Ricordare quel ponte è ricordare un momento di gloria che è per me indimenticabile. Non fu facile attraversare un ponte che, tanto lungo e complicato, sembrava aumentare ad ogni mio passo. Era assicurato da qualche corda poco fidabile ed era composto da parecchi pezzi di legno. Tra questi pezzi c'erano delle breccie che spaventavano chi osasse attraversarlo. Senza un'altra uscita, cercai di fare i primi passi tenendomi in equilibrio sulle corde. Tremavo. Guardavo in giù, ma subito deviavo lo sguardo. Non era per niente facile guardare la corrente rumorosa di laggiù. Immaginavo che uno dei tronchi portati dal fiume potrebbe essere me stesso. E questo sommato all'angoscia di voler uscire subito da lì generava una sensazione conflittuosa. Pensavo indefinite volte alla possibilità di desistere, alla paura di cadere e a tante altre insicurezze. Ma non desistii. Per quanto distante potesse essere l'altra riva non avevo motivi per fermarmi. Mi restava proseguire in avanti. Dopo che la traversia fu conclusa, guardai quel grande buco dietro a me e cercai di comprendere la sua reale dimensione. Arrivai, infine, all'altra riva”.

Ancora in questo periodo di convalescenza, Rodrigo ricorda di un altro momento importante. Percependo la sofferenza di sua mamma dinnanzi al suo dolore le disse: “non voglio vederti preoccupata con i miei dolori. Devi capire che tali dolori sono miei. Comprendi che ciò che mi fa male è mio. Sono situazioni che io ho bisogno di vivere, sono passi che io devo fare, questa è la croce che io devo abbracciare”.

Fu questo abbraccio personale che, lungo la sua vita, diede forze a Rodrigo per andare oltre le proprie difficoltà e donarsi: quando bambino, con i suoi piccoli gesti di amore al prossimo; quando adolescente, amministrando con gli amici uno studio grafico amatoriale che destinava parte dei suoi utili ai poveri e alla formazione di “uomini nuovi”; quando giovane, partecipando attivamente al Centro Accademico della sua facoltà di Psicologia e ad un partito politico.

Rodrigo, ancora nel 2000, fece un'altro intervento chirurgico dovuto il rifiuto della protesi organica e al sorgere di una fistola nel palato. Dopo di questo, ancora altri due interventi.

Oggi Rodrigo abita in Italia dove si specializza in “Fondamenti e prospettive di una cultura dell'Unità”, presso l'Istituto Universitario Sophia, del Movimento dei Focolari. La disponibilità è la stessa di sempre. Grazie a tale disposizione è conosciuto come il “sindaco di Tracolle”, residenza degli studenti dove abitano 14 alunni di diversi paesi, e la cui amministrazione Rodrigo prese con dedizione. Nel futuro, pensa di sposarsi e, sopratutto, “servire l'umanità”. Il giovane identifica l'amore di Dio con una rosa.

 “Quella rosa era la grande scoperta che feci nella mia vita, era esattamente la rivelazione di Dio in ogni fase vissuta, in ogni momento; percepii la gioia necessaria per vivere ogni esperienza. Questa rosa rappresentava niente meno che Dio, essendo coltivata in me da piccolo. Secondo Chiara Lubich, è molto facile sentire attorno a noi che non esistono rose senza spine. Ma in verità non esistono spine senza rose. Dietro ogni fatto, ogni avvenimento, sia doloroso o no, piccolo o grande, forte o debole, Dio è lì e ci accompagna”. E il racconto finisce così: “Mi sento bene. Trovai la rosa”.



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3.11.10

Não há espinhos sem rosas

Em fevereiro deste ano, foi publicada uma matéria na revista Cidade Nova que conta a minha experiência de vida, destacando momentos significativos. O jornalista Daniel Fassa, a partir de uma entrevista realizada comigo e com a minha mãe, conseguiu escrever de forma simples e brilhante algumas das passagens mais importantes, destacando o essencial de minhas escolhas. Vale a leitura.

Não há espinhos sem rosas

O significado da dor na vida de uma criança que supera todas as fases até tornar-se um jovem, feliz e empreendedor. A travessia de Rodrigo Fernandes Meireles nos mostra os frutos da dor abraçada, aceita e transformada.

Daniel Fassa

"Até ali, eu havia andado demais. Aventurei-me caminhando naquela estrada cheia de curvas e mistérios. Procurando desvendar cada imagem que aparecia, cada som que ouvia, cada sensação. Eu sempre segui em frente, não havia razão para parar. Sentia que nada podia me deter. E assim eu ia desafiando as trilhas que encontrava. Pode parecer que eu andava só, mas não me sentia tão só assim, mesmo quando pairava a dúvida acerca dessa companhia. Alguém caminhava comigo e eu sentia isso nas profundezas do meu eu.” 

Por trás dessas palavras do conto “A Rosa”, de Rodrigo Fernandes Meireles há toda uma vida. Uma vida de desafios, superações, alegrias e grandes descobertas. Uma vida de encontro com uma rosa.

Rodrigo nasceu em 30 de novembro de 1982, em Fortaleza (CE), numa família católica. Nas palavras da mãe, “era uma criança feliz, sempre alegre e sorridente, sempre sereno. Gostava de brincar com blocos de madeira, com Playmobil, e passava horas concentrado em algum brinquedo, na maioria das vezes, conversando com os amigos imaginários. Era uma criança precoce, que aprendia rápido, logo foi para a escola. Gostava muito de cantar e sabia de cor todas as músicas infantis que lhe ensinávamos. Nunca estava de mau humor e a sua alegria e vivacidade nos contagiavam, nos desarmavam quando alguma coisa nos deixava aborrecidos. Na escola, logo se entrosou com as outras crianças e também lá era uma criança solícita; sua alegria cativava a todos”.

Solicitude e alegria sempre foram as marcas distintivas de Rodrigo, da infância à juventude, de tal modo que nem sempre era fácil imaginar o tamanho dos desafios que ele enfrentava a cada dia. Rodrigo nasceu com Síndrome de Crouzon, doença genética que impede o crescimento do crânio e, consequentemente, um desenvolvimento normal do cérebro, podendo acarretar problemas neurológicos, perda das funções motoras, retardo mental e até a morte. Por isso, até os 23 anos, se submeteu a sete cirurgias. 

"Quando fiquei sabendo que Rodrigo tinha Síndrome de Crouzon, pensei no seu futuro: como seria difícil a sua vida, numa sociedade hedonista, que valoriza a beleza, a estética; quantas dificuldades surgiriam para a sua socialização, por quantas rejeições passaria; depois, quanto sofrimento físico viria com todas as cirurgias necessárias e quantas sequelas poderiam advir como consequência daquela má formação” – recorda Teresa, sua mãe. “Teria ele um desenvolvimento psicomotor normal, cognitivo ou apresentaria algum retardo no futuro? Diante desse quadro pouco favorável, entendi que Rodrigo precisava mais do que nunca ser amado e protegido. Então, decidi em meu íntimo ser o escudo do meu filho, dar a vida por ele, lutar por ele, protegê-lo de todas as maneiras possíveis, para garantir-lhe um tratamento adequado, que favorecesse o seu desenvolvimento e também sua socialização”, continua ela.

Os pais assumiram o compromisso de enfrentar com o menino as dificuldades, e ajudá-lo em tudo. O sofrimento e as preocupações deles eram enormes, mas procuravam não demonstrá-los e transmitir a Rodrigo apenas segurança e o orgulho que tinham dele.

A primeira cirurgia foi realizada em Fortaleza logo aos dois meses de idade e teve sucesso. Depois disso, todo o tratamento passou a ser conduzido por uma equipe de médicos de São Paulo, o que acarretou muitas e longas viagens. O segundo procedimento cirúrgico, inicialmente previsto para dali a cinco anos, acabou sendo realizado em caráter de urgência, quando Rodrigo tinha apenas três anos de idade, devido a uma inesperada hipertensão intracraniana que se manifestou sutilmente através de uma episódio de vômito na escola. Dessa vez, uma infecção hospitalar o manteve internado por um mês.

O quadro só se agravou, a infecção já era generalizada e nem os melhores médicos conseguiam recuperar a saúde de Rodrigo. Foi uma experiência muito intensa, como conta Tereza: “Entendi que não somos mesmo nada e diante daquela situação decidi doar-me totalmente a Deus. Foi ali, naquela dor imensa, que Deus se revelou a mim e eu resolvi segui-Lo. Pouco depois, Rodrigo recebeu a visita de um padre, que lhe deu a unção dos enfermos. Para a surpresa de todos, alguns dias depois ele teve alta, sem febre e sem sinais de qualquer infecção”.

De fato, alguns anos depois, Tereza abraçaria uma consagração especial no âmbito do Movimento dos Focolares, que havia conhecido pelos pais e, principalmente, pelos inúmeros membros que se fizeram presentes na vida de sua família durante o tratamento de Rodrigo.

Depois da longa fase de crescimento, chegou o momento de fazer uma terceira cirurgia. Já com 12 anos, Rodrigo pôde dar um passo importante: “Minha mãe me disse: ‘Até aqui eu acompanhei você, viajamos juntos para São Paulo, estive todo o tempo ao seu lado. Agora você já pode decidir o que quer fazer e como quer fazer’. Foi a primeira grande escolha que fiz, o primeiro passo que pude dar, pessoalmente, o meu sim”. Rodrigo estava certo. Aquele “sim” pessoal de 1995 era o primeiro de muitos que ainda diria dali para frente; principalmente nos momentos de dor.

Em 2000, com 17 anos, ele viveria a cirurgia mais difícil e teria que permanecer em São Paulo por um mês. Toda a família resolveu acompanhá-lo. Rodrigo recorda também da atmosfera descontraída que antecedeu a cirurgia: “As enfermeiras olhavam a gente conversando, sentados nas camas, no sofá do apartamento do hospital. Não parecia que alguém ali estivesse sofrendo. O clima entre as pessoas era muito favorável, era uma atmosfera que me fazia respirar aquela descoberta do amor de Deus”.

No período pós-operatório, num dos dias de dor mais intensa, Rodrigo gritou, tomado pelo sofrimento. Apenas sua mãe estava com ele no quarto. Ela segurou sua mão e disse com seu imenso amor de mãe: “Estamos em cima de uma ponte agora. O que vamos fazer? Atravessaremos o rio ou ficaremos aqui?” Rodrigo precisava continuar dando seus passos, o seu “sim”. Não podia parar ali. E não parou, como narra em seu conto “A Rosa”: 

"Recordar aquela ponte é lembrar um momento de glória que considero inesquecível. Afinal, não foi fácil atravessar uma ponte que, de tão comprida e complicada, parecia que aumentava a cada passo meu. Ela estava segura por algumas cordas não muito confiáveis e era preenchida por várias tábuas de madeira. Entre algumas dessas tábuas haviam brechas que assustavam qualquer um que se atrevesse a atravessá-la. Não vendo outra saída, procurei dar os primeiros passos equilibrando-me nas cordas. Eu tremia. Olhava para baixo, mas rapidamente desolhava. Não era fácil ver aquela correnteza barulhenta lá embaixo. Eu imaginava que um dos muitos troncos que eram carregados pelo rio poderia ser eu. Isso, somado à angústia de querer sair dali logo, gerava uma sensação conflituosa, que me fazia perguntar indefinidas vezes quanto à possibilidade de desistir, quanto ao medo de cair ali mesmo e tantas outras perguntas. Mas não desisti. Por mais distante que a outra margem pudesse estar, eu não via motivos para parar. Só me restava seguir em frente. Ao concluir a travessia, olhei para aquele buraco que ficava para trás e procurei entender a sua real dimensão. Cheguei, enfim, à outra margem.”

Ainda nesse período de recuperação, Rodrigo se lembra de outro momento importante. Percebendo o sofrimento da mãe diante da sua dor, disse-lhe: “Não quero ver você se preocupando com as minhas dores. Você tem que entender que essas dores são minhas. Compreenda que o que me faz sofrer é meu. São situações que eu preciso viver, são passos que eu preciso dar, essa é a cruz que eu preciso abraçar”.

Foi esse abraço pessoal que, durante toda a vida, deu forças a Rodrigo para ir além das próprias dificuldades e se doar: quando criança, com seus pequenos gestos de amor ao próximo; quando adolescente, administrando com amigos uma gráfica amadora que destinava seus lucros aos pobres e à formação de homens novos; quando jovem, participando ativamente do Centro Acadêmico de sua faculdade de psicologia e se filiando-se a um partido político.

Rodrigo, ainda em 2000, faria outra cirurgia devido à rejeição da prótese orgânica e ao surgimento de uma fístula no céu da boca. Depois dessa, mais duas intervenções cirúrgicas.

Hoje, Rodrigo mora na Itália, onde se especializa em “Fundamentos e Perspectivas de uma Cultura da Unidade”, no Instituto Universitário Sophia, do Movimento dos Focolares. A disponibilidade é a mesma de sempre. Graças a essa disposição é conhecido como “o prefeito de Tracolle”, residência estudantil onde moram 14 alunos de diversos países, e cuja administração financeira Rodrigo assumiu com muita dedicação. No futuro, ele pensa em se casar e, acima de tudo, “servir à humanidade”. O jovem indentifica o amor de Deus com uma rosa.

"Aquela rosa era a grande descoberta que eu fiz na minha vida, era justamente a revelação de Deus em cada fase, em cada momento, percebi a alegria necessária para viver cada experiência. Essa rosa representava nada mais nada menos que Deus sendo cultivado em mim desde pequeno. Segundo Chiara Lubich, é muito fácil ouvir por aí que não existem rosas sem espinhos. Mas também não existem espinhos sem rosas. Por trás de cada fato, de cada acontecimento, seja ele doloroso ou não, pequeno ou grande, forte ou fraco, não importa, Deus está ali e nos acompanha”. E o conto termina assim: “Sinto-me bem. Encontrei a rosa”.



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31.10.10

Tire as mãos de uma criança

A Casa do Menor São Miguel Arcanjo, entidade sem fins lucrativos que acolhe crianças e adolescentes em situação de risco, iniciou uma campanha internacional para combater os abusos cometidos aos menores de idade. Apoiando esta causa, decidi reproduzir o texto da campanha e o vídeo veiculado na Itália. Convido você a fazer uma doação no site da campanha (em italiano). Colabore!

Em todo o mundo, 100 milhões de crianças vivem nas ruas, vítimas de abusos de qualquer espécie, sem ninguém para falar do seu próprio sofrimento, privados de tudo, (pai e mãe, casa, escola, profissão, trabalho, futuro), abusados por pessoas inescrupulosas na prostituição, inseridos no no narcotráfico ainda crianças, eliminados sem piedade quando erram, caçados como animais selvagens por esquadrões da morte. Padre Renato Chiera, fundador da Casa do Menor, salvou dezenas de milhares de pessoas, dando-lhes uma vida tranqüila. Mas a Casa do Menor não está satisfeita, quer salvar mais e mais para impedir principalmente a exploração generalizada através de uma obra de sensibilização internacional. Começando na Itália - primeira no ranking vergonhoso do turismo sexual, seguida pela Alemanha, Grã-Bretanha e os Estados Unidos. A campanha foi realizada gratuitamente pois todos os trabalhos foram doados, em toda a sua produção: a partir da idealização estratégica da Fundação NewEtica, da criatividade - grupo internacional de publicidade McCann Erickson, do fotógrafo alemão Achim Lippoth e das casas de produção italianas Mercurio Cinematografica e Eccetera, pela dupla de diretores argentinos Mico e Martin, na trilha sonora o grupo anglo-americano Antony and the Johnsons.  E o mesmo vale para os materiais (fotolito, vídeotapes, DVDs) e serviços (impressão, cópia, correio): todos doados por aqueles que acreditam na causa e todos sem uso de dinheiro público. Porque se não deixamos se envolver aqueles que já estão mais abertos à comunicação, como poderemos esperar o envolvimento de pessoas comuns? O sucesso da campanha na Itália e no Brasil depende da sua extensão a outros países. E o sucesso no Brasil, depende muito de você. Por favor, dei-nos a mão para espalhá-lo?




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30.10.10

O século XX em sons e imagens

Sinta-se convidado a viajar no tempo através do original e premiado documentário "Nós que aqui estamos, por vós esperamos". Este filme de Marcelo Masagão conta a história do século XX a partir de personagens comuns, que viveram e morreram dedicando a própria vida para cada mudança vivida pela humanidade neste período. A viagem acontece com a criteriosa seleção de fotografias e pequenos vídeos de eventos que marcaram o século, como as guerras, o movimento feminista, a evolução do trabalho e o desenvolvimento tecnológico, acompanhada de uma trilha sonora original.

Ao final do documentário é possível entender como o autor se inspirou para o sugestivo título da sua obra, que foi premiada em 2000 no Festival de Gramado (melhor montagem) e no Festival do Recife (melhor filme, melhor roteiro e melhor montagem). São 73 minutos que relatam os altos e baixos que marcaram a história recente. Coloquei uma playlist do YouTube dividindo o filme em 8 partes, que podem ser vistas uma a uma aqui. Para passar de uma parte a outra é só usar as setas laterais. Ademais, a mesma playlist pode ser vista no meu canal do YouTube.






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20.10.10

Birds on the Wires: o som da natureza

Por indicação de meu amigo Mário Sebok, conheci um exemplo de como a poesia e a arte nos circundam e de como é possível percebê-la em nossa carne, isto é, estando implicados com o mundo. Jarbas Agnelli, um publicitário de São Paulo, ao ver uma fotografia publicada no jornal O Estado de São Paulo, viu o que poucos, ao ver a mesma imagem, viram: uma música numa original "pauta" composta por pássaros pousados em fios elétricos. Um simples olhar o fez tocar a arte percebendo o que para muitos era invisível.

Compartilho o pequeno vídeo que ilustra bem o que ele percebeu e que gerou uma surpreendente repercussão em todo o mundo.

Acrescento que, em 2009, o criativo compositor fez uma apresentação no TEDx São Paulo, onde relatou esta singela experiência e interpretou o arranjo com uma pequena orquestra. Vale à pena conferir no próprio site do evento clicando no link acima.

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17.10.10

As eleições e o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza

Hoje, 17/10, é o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Dia que chama a atenção do mundo para o primeiro dos oito objetivos assinados por 189 países há dez anos na Cúpula da ONU. Já escrevi um artigo sobre os objetivos de desenvolvimento do milênio, mas hoje quero destacar a necessidade e a importância da erradicação da pobreza para dar melhores condições de vida às pessoas que hoje sofrem com esse problema. Juntamente com outros 376 blogueiros de todo mundo, unidos através do Bloggers Unite, podemos entrar nesta discussão e refletir juntos o que é possível fazer.

Aproveitando o clima de eleições no Brasil, que neste exato momento está fervendo em debates pouco profundos, gostaria de confrontar os programas de cada candidato acerca do combate à pobreza.

Para melhor avaliarmos estes programas, é importante que nos coloquemos de frente a pelo menos duas perguntas básicas: a primeira, o que é pobreza? E a segunda, por que e como devemos erradicá-la?

Normalmente, quando falamos de pobreza fazemos referência à carência material ou mesmo à miséria a que estão submetidas milhões de pessoas em todo mundo. Todavia, alguns estudos apontam para uma descrição mais profunda desta questão, através da qual a pobreza representa uma privação de poder. Para Amartya Sen (1999), não podemos compreender o fenômeno da pobreza sem considerar a ética dos ideais de bem-estar humano, que ao longo da história a economia paulatinamente escondeu. Tratar a pobreza como uma mera falta material nos faz cair em um utilitarismo, cuja solução nos remeteria a um dar esmolas sem considerar a demanda de justiça social de quem se encontra imerso neste duro contexto. Citando Virginia Moreira (2000), "a privação de poder e controle pode ser visto como uma inabilidade em exercer 'liberdade'. Isso, por sua vez, causa a pobreza" (p. 210). É nessa linha que Amartya Sen propõe, para combater a pobreza, um desenvolvimento como liberdade. Erradicar a pobreza, tida como privação de poder e limitação das capacidades morais humanas, é necessário para libertar as pessoas da dominação de um sistema que as esmaga, tolhendo a sua voz e limitando a sua participação social. Da mesma forma como se faz necessário abolir os estigmas ligados a esta privação, como o estigma que associa ao pobre a imagem de incapaz. Ainda segundo Virgina Moreira, "as experiências de verdadeira cidadania [dos pobres] são limitadas, por não sentirem poder sobre suas vidas públicas" (ibidem).

Como erradicar a pobreza? Partindo do quanto já descrito, Amartya Sen (2000) aponta a necessidade de mudar a lógica de desenvolvimento econômico associando a esta o desenvolvimento humano. Não é possível pensar em desenvolvimento econômico sem considerar o desenvolvimento humano. Do contrário, continuaremos a assistir ao avanço das desigualdades sociais. Segundo ele, Faz-se necessário criar oportunidades sociais para as pessoas de baixa renda para que elas se sintam incluídas no fazer econômico. Ele afirma que: "a expansão dos serviços de saúde, educação, seguridade social contribui diretamente para a qualidade de vida e seu desenvolvimento. Há evidências até de que mesmo com renda relativamente baixa, um país que garante serviços de saúde e educação pode efetivamente obter resultados notáveis de duração e qualidade de vida de toda a população" (p. 170). Portanto, é preciso melhorar os serviços básicos para proporcionar um desenvolvimento integral da pessoa e favorecer a sua inclusão social, aumentando as suas capacidades de ação e participação na vida pública.

Considerando estes pressupostos, podemos conhecer os programas de cada candidato. Comecemos com o programa da coligação "O Brasil pode mais" do candidato José Serra (PSDB). Segundo consta no seu site, as propostas para o combate à desigualdade social prevêem uma continuidade e uma ampliação dos programas já existentes, como o Bolsa Família, com a novidade da criação de um 13o. para este benefício. Além disso, prevê a criação de uma bolsa de estudos para a qualificação educacional e profissional dos jovens, oferta de cursos rápidos de qualificação e requalificação para o trabalho e o investimento em casas para a população carente com até 3 salários mínimos. Está na pauta também a criação de uma secretaria especial para o semiárido, a reestruturação da SUDENE e a criação do Conselho de Desenvolvimento da Amazônia.

O programa da coligação "Para o Brasil seguir mudando" da candidata Dilma Roussef (PT) diz que é necessário continuar a linha dos programas em vigor, como o Bolsa Família, proporcionando a transição deste programa para o Renda Básica da Cidadania (RBC), projeto aprovado pelos partidos em 2004 e sancionado pelo presidente Lula que assegura "a participação de todos na riqueza da nação". Além disso, citando alguns pontos do programa relativos à diminuição da desigualdade social, a coligação de Dilma propõe a ampliação do emprego formal, a manutenção da política de valorização do salário mínimo, a expansão e facilitação do crédito popular, a expansão do programa Territórios da Cidadania, a intensificação dos assentamentos com o necessário apoio técnico aos assentados, o fortalecimento da agricultura familiar e da agroindústria familiar, e o "estímulo ao cooperativismo e outras formas de economia solidária".

Estas são as propostas que colhi dos candidatos voltadas para o combate à desigualdade social, bastante ligada ao conceito de pobreza de que tratei há pouco. Ambos os programas estão escritos de forma vaga e genérica, muitas vezes propondo a expansão e melhoria do que já existe sem especificar o que pode ser feito com mais precisão.

Posso fazer duas observações importantes no processo de escolha entre um candidato e outro, sobretudo acerca do tema abordado neste texto: em primeiro lugar, o fato de que os programas em muito se complementam, havendo pontos positivos em ambos que precisam ser levados em conta; e em segundo lugar, o fato de que para considerarmos diferenças entre os candidatos faz-se necessário conhecer mais do que as propostas que eles fazem, conhecendo a política que está por trás do fazer de cada um. É preciso reconhecer qual é a política adotada por um e outro e verificar com qual delas estamos mais identificados e comprometidos. Além disso, acrescento que, considerando a campanha em andamento, é importante também reconhecer o nível de coerência no discurso de cada um. Num processo contaminado por notícias falsas que circulam rapidamente pela internet e pela grande mídia não é difícil perceber que existem grandes diferenças. No que tange à pobreza, é válido fazer uma pesquisa na própria internet para levantar e avaliar os dados relativos. Com esses dados, podemos avaliar em qual situação o Brasil se encontra e em que podemos melhorar.

Referências bibliográficas:
Sen, A. Sobre ética e economia. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
_____. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
Moreira, V. Psicopatologia e pobreza. In: Moreira, V. e Sloan, T. Personalidade, ideologia e psicopatologia crítica. São Paulo, Escuta, 2002, p. 207-229.



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16.10.10

A internet e a sua força nas eleições 2010

Como podemos ver, o debate eleitoral tem se tornado cada vez mais acalorado e as notícias voam com uma velocidade incrível. "Nunca antes na história deste país" tivemos tamanha troca de informações em prol das eleições. Os candidatos se prepararam antes do processo eleitoral iniciar e se armaram com blogs, twitters, facebook e orkuts, criando perfis, comunidades e sites para abrir novos canais de comunicação com o eleitor. Além disso, os blogueiros de plantão, entre jornalistas e cidadãos comuns, também intensificaram o debate na rede mundial de computadores.

Segundo estatísticas colhidas pelo site To be Guarany!, no Brasil já temos mais de 67,5 milhões de internautas, dos quais pelo menos 36,4 milhões têm acesso regular, em casa ou no trabalho. Considerando o total, ao menos 87% acessam a internet semanalmente e o ritmo de crescimento tem aumentado intensamente. Segundo a Agência Estado, o Brasil ocupa a quinta posição em mercado de celulares e internet.

Nesse contexto, como muitos blogs e analistas puderam confirmar, o resultado das eleições presidenciais no primeiro turno foram bastante influenciados pela troca de informações virtuais. Além disso, é mais fácil para o eleitor ter contato com notícias de diversos espectros sem ficar restrito àquilo que é veiculado pela grande mídia. Ainda que esta última detenha o controle das próprias notícias, selecionando a matéria que lhe convém, com a internet o eleitor tem maiores chances de democratizar o debate em torno de cada campanha.

Como sabemos, em uma democracia, opiniões diferentes e até contraditórias são parte do jogo. Faz-se necessária uma discussão que possibilite aos cidadãos uma leitura ampla da própria realidade, encontrando divergências e convergências, dialogando e tentando discutir como melhorar a vida comum a eles. A política, numa democracia, cuida do que é de todos, abrindo espaços de diálogo entre os cidadãos e garantindo liberdade e igualdade de expressão. O objeto da política é o bem comum.

Lamentavelmente, o que vemos nas últimas semanas na internet e na grande mídia não corresponde exatamente à descrição acima. Assistimos a uma onda difamatória e caluniosa capaz de criar um racha na consciência e na memória brasileira, incitando o ódio a quem se declare a favor da candidatura de Dilma. É impressionante como na grande mídia (refiro-me aos principais jornais e revistas) é difícil encontrar alguma matéria positiva à respeito da candidata do governo, Dilma Roussef. Querem ludibriar o povo brasileiro e fazê-lo acreditar que José Serra é o santo, o cristão, o abençoado, ou o "homem de bem", enquanto que à Dilma são associadas as imagens de "assassina", "bandida" e "matadora de criancinhas". É a "mulher do mal" contra o "homem de bem". Estou indignado com tanta farsa e tamanha baixaria!

O meu consolo é que a democracia hoje só tem a ganhar com meios como a internet, de modo a não se intimidar com a força paranóica e ultra-conservadora da grande mídia. Posso, mesmo distante do Brasil, estar à par do que acontece, indignar-me e fazer chegar a todos os que conheço a minha indignação. O curioso é que em meio às minhas manifestações, já fui chamado de tendencioso e imparcial, mas, se analisarmos com profundidade a realidade atual da discussão, imparcial é um jornal como a Folha de São Paulo que publica na capa de sua edição de 12/10 uma foto onde Dilma não faz o sinal da cruz em uma celebração. Imparciais são os meios que publicam uma foto de José Serra beijando o crucifixo de um rosário em plena carreata, em Goiás. Em suma, imparcial é quem não se abre ao diálogo e não permite a discussão de temas mais sérios do que fofocas e difamações. Onde existe manipulação e calúnia, não existe espaço para a liberdade, rompendo com isso a própria lógica da democracia.

Contra esse tipo de absurdo continuarei a me manifestar, certo de que posso exercer o meu direito de cidadão, alertando os desvios e fomentando um debate justo e verdadeiro em torno do que realmente interessa para o Brasil. Nos meus perfis do Twitter, do Facebook e do YouTube tenho discutido intensamente sobre estas questões. Convido a todos a fazerem o mesmo, intensificando o debate eleitoral.

Viva a internet e a liberdade!


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12.10.10

Refletindo sobre o segundo turno das eleições 2010

É preocupante o rumo que as eleições tomou no nosso país, sobretudo no período do segundo turno. A igreja entrou no meio da discussão divulgando o apoio de muitos bispos ao PSDB alegando que o PT está institucionalmente engajado na implantação da cultura da morte, dado que possui itens em seus estatutos que apontam nessa direção. Por outro lado, esquecem-se de dizer que a política neoliberal, típica do PSDB, é também favorável a descriminalização do aborto, ainda que não o afirmem por meio de estatutos. Para confirmar este dado nos é necessário somente observar a política vigente em outras nações de base neoliberal, onde o aborto e a tão temida cultura de morte já é lei. Acrescento que as Nações Unidas, como bem recordam alguns bispos brasileiros, também se mostram favoráveis a tal cultura. Não nos esqueçamos que o próprio José Serra, quando era ministro da saúde do governo de FHC, assinou medidas a favor do aborto.

O que quero argumentar com isso?
Simplesmente que não podemos tomar como base para o nosso voto consciente somente um lado da moeda e julgar uma só candidatura como se a outra nada tivesse a dizer à respeito deste assunto. Ademais, a "guerra santa" propagada no embate do segundo turno chegou ao extremo e cada candidato/partido quer se mostrar mais cristão do que o outro, criando imagens destrutivas do rival como se um fosse amaldiçoado e o próprio abençoado. Além de revelar uma grotesca hipocrisia em ambos. Vi, estarrecido, imagens do candidato José Serra beijando a cruz de um rosário em uma carreata no Estado de Goiás. Imagens de momento, onde prevalece o apelo (eu diria também suplício) aos votos cristãos. De outro lado, a candidata Dilma Roussef também aparece em igrejas com mais freqüência, como mostram imagens recentes do Santuário de Aparecida, em São Paulo, e tem afirmado com mais veemência o que antes não dizia em público.

Não entremos nessa guerra santa como se um fosse melhor do que outro considerando somente este viés. Ambos os candidatos e seus respectivos partidos não podem ser pensados somente sobre este pontos de vista porque não mostram coerência em seus discursos e práticas. Sem falar que estes temas não são unanimidade entre os membros de ambos os partidos, havendo membros que pensam o contrário do que os partidos pregam. No que toca o ponto de vista religioso, ambos se anulam e, portanto, este não é um ponto que nos traz boas possibilidades de reflexão. Em matéria de aborto e cultura de morte, o que vemos é o sujo falando do mal lavado.

Preciso acrescentar que nenhum dos dois candidatos me agradam particularmente, no entanto não posso ficar alheio a este debate. Como então pensar o que seja melhor para o nosso país?

Pensemos no projeto de país. Não nos esqueçamos do que cada partido foi capaz de realizar e de qual política realizam. Vamos colocar na balança os resultados dos projetos de cada candidato/partido e discutir as verdadeiras diferenças entre eles. A partir dessas diferenças, podemos avaliar o nosso voto e saber quem realmente representa o melhor para o nosso país.

Para quem desejar, compartilho o link da nota oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) sobre o assunto, bem como da nota oficial da CBPJ (Comissão Brasileira de Justiça e Paz), ligada à CNBB.


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